Lisboa já foi um dos grandes palcos de ópera da Europa.
Nos anos 40 e 50 do século passado, todas os grandes cantores passaram por S.Carlos, alguns repetidamente.
E quase sempre, depois das récitas no famoso teatro, faziam uma ou duas vezes o espectáculo no Coliseu dos Recreios.
Os preços no S.Carlos não eram acessíveis à esmagadora maioria dos portugueses. E as assinaturas, quase todas reservadas já pelos grandes “senhores”, ainda menos.
Assim, o público em geral esperava pelo Coliseu, para poder assistir e apreciar.
Ora acontece que os grandes cantores temiam muito mais as récitas mais populares do que as outras, pois diziam que os verdadeiros apreciadores e conhecedores eram os que iam até às Portas de Santo Antão.
Este contraste sempre me fez sorrir.
Por ser verdadeiro.
sexta-feira, 13 de abril de 2007
Coliseu dos Recreios
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21 comentários:
Era aqui que se julgava um artista verdadeiramente. E muitos foram os cantores portugueses que deram provas da sua qualidade artística neste palco como Elsa Saque e sua irmã Zuleika, Hugo Casaes, Armando Guerreiro, Álvaro Malta...A nova geração de cantores portugueses bem precisa de pisar palcos como este para sentir uma sala de grandes dimensões com uma multidão no escuro a escutar as suas vozes e interpretaçõs. Só porque pertence a uma ideia do passado abandonaram-se tais temporadas? O palco é que faz crescer um artista e os jovens cantores líricos portugueses são talvez os mais necessitados por essa Europa fora de prática constante de pisar um palco de ópera.
Pois é, caro anónimo, tem toda a razão.
Os tempos mudaram...o Coliseu vai buscar companhias de Leste que ninguém conhece...a sala fica meio vazia...ópera a "metro"...sem chama, fulgor, vibração.
Vi há meses um Rigoletto no Coliseu, e saí com uma frustração enorme.
É evidente que é preferível produções destas a nada, mas talvez houvesse em Portugal um naipe de jovens cantores que, com dignidade, fizesse o mesmo ou melhor.
Obrigado pelo seu comentário.
"Estreei-me" na ópera no Coliseu na Madame Butterfly em 1964 (tinha 13 anos)com Renata Scotto, a melhor intérprete do papel no momento. Desde essa data até 1980 via quase todas as óperas, tendo visto a nata dos cantores mundiais: Gobbi, Cristoff, Caballé, Corelli, Cossoto, Kraus, Stella, Bergonzi,.... Às vezes ia a S. Carlos, que começou a ser um hábito em meados de setenta. Depois da "temporada" do Coliseu fazia a do Teatro da Trindade, que era o verdadeiro viveiro dos cantores portugueses. Por vezes estes iam cantar papéis principais ao Coliseu, mas também o iam ao S.Carlos, mas era raro assumirem papeis principais ombreando com os estrangeiros. Quando faziam papeis principais era em elencos totalmente nacionais. A excepção era a Zuleika Saque, que tinha uma carreira internacional. O Kraus que parece que tinha uma feitio um bocado difícil era um cantor regular do S.Carlos/Coliseu, mas durante algumas temporadas esteve zangado com Lisboa e não veio. O motivo da zanga foi de ter-se recusado a actuar com a Elsa Saque ao mesmo nível, só aceitando a Elisete Bayan (a Zuleika estava na sua carreira internacional). O seu regresso foi com o Fausto com a Zuleika e o Malta, uma grande presença no Mefistófles. Eu estive nessa récita (1982).
Raul
Caro Raul
A minha "estreia" foi em 1966 (tinha 12 anos) com um "D.Giovanni"! Forte para um miúdo, não acha? Confesso que não fiquei deslumbrado, até pela duração da ópera...mas ia embalado por um "Rigoletto" em LP com a Scotto, o Kraus (coincidências) e o Bastianini.
Desses bons velhos tempos, a última ópera que vi no Coliseu foi o "Werther" com o Kraus, a Cotrubas e a Elsa Saque.
Uma curiosidade: sabia que a Zuleika andava sempre com a Freni, porque quando esta não se sentia bem era a portuguesa que a substituía? E quem sabe em Portugal quem foi a Zuleika??
Obrigado pelo seu comentário.
A récita a que se refere do "Werther" de Massenet foi no ano de 1992 e não em 1982, como escreveu. Creio ser assim pois vem especificado num programa da RTP que possuo em VHS denominado "A minha ópera favorita" em que o protagonista foi Alfredo Kraus, contracenando com a Cotrubas e com a nossa Elsa Saque, uma das nossas melhores cantoras líricas portuguesas.
Eu não escrevi que o Werther tinha sido em 1982....
Quem falou em 82 foi Raul Pissarra, e referia-se a um Mefistófeles.
Eu também tenho essa gravação do Kraus em S. Carlos no Werther. Desse ciclo de programas faziam parte também os "Capuletos e Montéquios" com a Ricciarelli, o "Don Pascoale" com a Barbara Hendricks, o Don Giovanni com o Ruggiero Raimondi (o meu favorito)... Não sei se houve mais, só tenho esses quatro gravados.
A única vez que vi ópera no Coliseu foi uma Traviata em 1994. Na verdade até vi duas vezes... a última em grande estilo, com chmapagne no camarote (já viram o chique de assistir ao "Libiamo" de flute na mão?...). E há uma história deliciosa relacionada.
As récitas iam ser todas feitas pela Ticiana Fabriccini, que vinha precedida de uma enorme fama no papel, por o ter cantado dirigida pelo Solti. Bastante armada em diva. Bastante irritada com os caprichos dela, uma certa pessoa muito conhecida e cujo nome não vou dizer, até comentou na altura "A mulher não canta ópera, canta Traviatas!"
As récitas esgotaram todas e o Tito Celestino da Costa resolveu fazer mais uma e teve de arranjar nova Violetta, que a Fabriccini não queria ou não podia fazer mais nenhuma. O Tito lá desencantou uma belga em princípio de carreira, a Isabelle Kabatu - aqui para nós foi bem melhor do que a outra. Ora a Isabelle Kabatu era... preta. Em pouco tempo, nos bastidores (note-se que a outra ainda cá estava quando a Kabatu chegou para os ensaios), já toda a gente, para as distinguir, se referia a ela como... a Roxa!
Dou sempre graças a Deus por ter a minha querida Paulinha para me contar estas tricas de bastidores.
Caro José,
Sim, um D.Giovanni para começo é forte. O meu primeiro Mozart foi precisamente o Don com o Tito Gobbi que também encenava. Mas eu já tinha 19 anos.
Tive em LP esse Rigoletto que refere. Era da Cetra, de capa perdominantemente azul. Um grande Rigoletto a que acrescentamos a o par Cossoto / Vinco. Quando veio a era do CD comprei um da DG e que eu considero um dos dois melhores Rigolettos (o outro é o da EMI com o Gobbi/Callas) que existem.Relativamente a este Rigoletto em CD só difere em dois intérpretes. O Diskau em vez do Bastianini e Bergonzi em vez do Kraus. A orquesta é dirigida pelo Kubelik,só rivalisando com o Carlos Kleiber também para a DG.
Relativamente ao facto da Zuleika ser a substituta oficial da Freni, lembro-me muito bem desta função, mas aqui o José, perdoe-me, mas fez uma confusão. A Zuleika era a substituta da Renata Scotto e não da Freni.
Raul
Ó Raul, desculpe lá, eu sou uma teimosa do pior e estou sempre a puxar a brasa à minha sardinha... onde encaixa o meu amigo o Rigoletto do Bonynge com a dupla Sutherland/Pavarotti? (e o grande Milnes no papel titular?...
Nunca mais apareceu na Gota, olhe que estou tristinha...
Teresa,
Nem queira comparar!!!
Sutherland e Milnes já muito maduros. Para a primeira deve procurar a gravação com o MacNeil e Cioni no apogeu da voz no início dos anos sessenta; para o segundo deve ir ao Carlos Kleiber, a primeira escolha para Berlim após a morte do Karajan e que era sem a menor das dúvidas o maior maestro do mundo, quando morreu há uns três anos. A gravação que o José mencionou (Bastianini, Scotto, Kraus) é por exemplo muito melhor, pois que o Bastianini é mais Rigoletto, a Scotto é a melhor Gilda depois da Callas e o Kraus é o perfeito Duque. Sobre as duas que elego como melhores tem que ver com muita coisa como, por exemplo, o detalhe fabuloso do Diskau, a identificação total do Gobbi, a genialidade da Callas e também da Scotto ao mostrarem só pela sua voz todos os problemas daquela jovenzinha, a perfeição estilística do Bargonzi e do Kraus.
Quanto a não ir à Gota, mil perdões. Tenho tido pouco tempo e quando o arranjo para blogues vou mais para a ópera, pois escrevo de um jacto. Tive de ir à capital do Império para preparar uma estadia lá de um ano. Mas prometo-lhe que ainda irei lá hoje, à Gota.
Safa, Raul!
Mas que grande ensinadela! Estou a rir, claro.
Gosto sempre de ter novos horizontes, novas perspectivas, anotei as suas sugestões, que muito agradeço, assim que puder tentarei ouvi-las (isto anda uma lástima, financeiramente, acho que nunca estive em tamanha penúria em toda a minha vida, e não tenho qualquer pejo em confessá-lo; não é vergonha, pois não?).
Outra questão: a capital do Império? Vai viver um ano em Pequim? Percebi bem? Ora aí está uma coisa interessante, queremos detalhes, se não se importar.
Mais outra questão: mencionou no seu comentário o Teatro da Trindade. Que esplêndido teatro para ópera! Vi lá há uns anos um Elisir d'Amore que me encantou. E note-se que quando o pano subiu fiquei logo a ranger os dentes de irritação, porque era uma das tais produções modernas com que os três (o Raul, o José e eu) embirramos: uma gigantesca fotografia do camarada Mao, aquilo passava-se na China comunista. Alguém viu esta produção? Conquistou-me por completo.
Não resisti a mandar um mail à companhia, de que ainda tenho cópia, tal como da resposta. Caso estejam interessados ponho aqui.
Olá a todos
Carlos Kleiber.
Em 1976 fez duas gravações absolutamente históricas: "Othello" e "Don Carlo". O primeiro eu tenho, mas o "D.Carlo"...por acaso nenhum de vocês tem? Placido Domingo e Freni, entre outros. Dão-se alvíssaras...Ando à procura desta gravação...desde 1976...Juro.
"Elixir" no Trindade.
Também lá estive!
Ana Ferraz na protagonista.
Mao em fundo.
Cantores portugueses a mostrarem que também são capazes.
Manuel Ivo Cruz na regência.
E autógrafos e parabéns nos camarins, finda a récita.
Teresa,
Eu vivi seis anos em Pequim (1986-1990 e 1992-1994), trabalhando, e agora só vou estudar, para apurar o meu chinês.
O Elixir de Amor com o Grande Timoneiro com pano de fundo?! E gostou ?
José,
Gostou dessa encenação com o Camarada Mao ?!
O Otello pelo Carlos Kleiber, meu Deus deve ser uma maravilha. Recentemente comprei um, uma edição de récitas memoráveis do Covent Garden. Muitíssimo bom: Kubelik: Vinay, Brouwenstjin, Otakar Kraus.
Desconheço o Don Carlo pelo C. Kleiber, mas tudo o que é dirigido por ele é fabuloso. O José tem a sexta de Beethoven, certamente.
Sobre o Trindade: é uma pena que não tenha a função que teve no tempo da Zuleika Saque. Sabe, José, eu estava na récita (a primeira da Lucia de Lammermoor nessa temporada)que virou a carreira da cantora. Que noite memorável, a do nascimento de uma cantora!
Raul
Pois a verdade é que, apesar da encenação estapafúrdia, adorei aquele Elisir diAmore.
Aqui fica o relato, em formato do mail que então lhes enviei:
"A toda a companhia, obrigada por uma grande noite de ópera!
A récita de sábado deslumbrou-me. Desde o princípio. Quando o pano subiu e vi a foto do Grande Timoneiro e o guarda-roupa não pude evitar resmungar entredentes “Oh não!!! Uma produção moderna e pretensamente com mensagem! O que eu embirro com estas coisas!” Mas não obstante a minha teimosia em gostar de ver qualquer ópera EXACTAMENTE como o compositor e o libretista a conceberam, a vossa produção deliciou-me. Divertidíssima, a ideia de pôr o Dulcamara como Tio Sam, a impingir Coca-Cola como panaceia universal, e para mais ladeado por duas partenaires tão extraordinariamente bem conseguidas (parabéns às duas, estavam sublimes). Um grande aplauso para João Miranda, fabuloso no papel. Houve momentos em que me fez lembrar vivamente o Enzo Dara, na melhor tradição do basso buffo. Amei a caracterização.
Ana Ferraz? Oxalá essa menina vá muito longe, oxalá haja quem repare nela e possa levá-la para fora da nossa tão estreita cena operática - ela está à altura. Muito mais do que uma voz MUITO bonita. O jogo cénico. O encanto (e ainda por cima é muito bonita), a expressividade. Uma Adina irresistível.
Pedro Chaves?... Tive pena que não estivesse na melhor das formas vocais. Gostei mesmo muito da voz, mas percebia-se que estava numa noite não (o que acontece aos maiores, sendo a voz um instrumento tão frágil). E ainda assim, foi um grande Nemorino. Adorei a expressividade fisionómica, que retratava à perfeição uma personagem até algo comovedora na sua ingenuidade e candura. Esteve brilhante.
Gostaria de Ter ido aos bastidores felicitar toda a companhia, mas o amigo que estava comigo é avesso a essas coisas. Ao longo de toda a récita fomos trocando olhares entre o surpreendido e o encantado. Não estávamos à espera desta noite de luxo, valha a verdade. A qualidade do canto... A homogeneidade da representação... tudo! O último “Elisir d’ Amore” que o meu amigo viu foi há dois anos, no Met, com o Alagna e a Gheorghuiu. Penso que gostarão de saber que ele gostou mais do vosso. Será preciso acrescentar mais alguma coisa?
Bem-hajam. Se possível, gostaria de ser informada das vossas próximas produções. Já me basta ter perdido as “Bodas de Fígaro”!"
José, eu tenho duas versões do D. Carlo, uma pelo Giulini e outra pelo Karajan. A do Kleiber está esgotada?!
Já procurou bem?
Raul,
Estou fascinada! Ter vivido anos em Pequim parece-me uma coisa do outro mundo! Muito deve ter você que contar!
Sabe que não encontro qualquer menção a um Don Carlo do Kleiber, José?
Veja este link, por exemplo:
http://www.geocities.com/rmlibonati/verdi2.html
Então só resta mesmo o Japão... encontram-se por lá coisas incríveis...
O "Don Carlo" do Kleiber não está esgotado...porque nunca foi lançado.
Tal como o "Othello" (mas esse consegui apanhar), são gravações-pirata. Mas de muito boa qualidade.
Se procurei bem, teresa?
Ando há mais de 30 anos numa busca constante...e deixe-me dizer alguns locais onde procurei : Londres, Milão, Roma, Paris e Nova Iorque. Para citar só alguns.
E sempre a mesma desilusão. Ninguém tem.
Teresa,
Para falar da China, passo-me para a Gota. Não está a ver nós irmos a casa de alguém e estarmos a discutir os nossos problemas sem prestar atenção a quem nos recebe.
Raul
Raul,
Agora estou a rir...
O José é um perfeito anfitrião, e aposto que também tem todo o interesse em conhecer as suas histórias. Aliás neste momento até estou a fazer uma coisa para ele, que nem está a correr lá muito bem (não posso dizer o que é, que ainda podia ir malhar com os ossos na cadeia... ele sabe). Assobiermos para o ar, como quem não sabe de nada...
Não se esqueçam de que uma Lucia de Lamermoor houve em que a nossa grande cantora Elisete Bayan bizou a cena da loucura.Nos anos oitenta porem houve quem quisesse por inveja perseguir esta grande cantora.Essas pessoas que numca chegaram a fazer grande coisa na lirica portuguesa teriam que nascer mil vezes para chegar aos calcanhares da Senhora Bayan.Hoje nimguem fala dela mas com tantas homenagens que por ai se fazem seria bom que ela fosse homenageada como merece.Só pecou em querer ficar em portugal que só protege na sua maioria quem se pauta pela mediocridade.
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