segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Estolas e Ressonar...

“Se os amantes da ópera são tão apaixonados por uma coisa tão chata, eles que paguem mais pelos bilhetes. Em qualquer caso, muitos desses fanfarrões só vão à ópera como ocasião social de confraternizar com os seus igualmente privilegiados amigos”.

Esta a opinião enviada por um leitor ao jornal “Evening Standard” em 1995.

Perdoando a este detractor da ópera o apelidá-la de “coisa” e “chata”…lembrei-me das inúmeras estolas que se passeavam em enrugados pescoços pelos salões do São Carlos, nos intervalos, no tempo da outra senhora. Estolas que durante as récitas ajudavam as donas a mais facilmente dormir e até ressonar, o que é tão incomodativo como os crónicos e inevitáveis ataques de tosse e catarro, enquanto os pobres cantores bem tentam continuar concentrados.
Como certamente muitos saberão, após as récitas no São Carlos, levava-se a encenação para o velhinho Coliseu dos Recreios, onde o preço dos bilhetes tornava acessível o espectáculo a um público muito mais vasto. E conhecedor.
O grande Alfredo Kraus dizia mesmo que tinha muito mais receio de cantar no Coliseu do que em São Carlos, porque o mais leve deslize significava “pateada” no Coliseu, dado que “o público conhece a Ópera de um modo mais exigente”.
E assim era, de facto.

Voltando à carta do leitor, sabem porque é que os teatros de ópera têm todos a forma de uma ferradura? Por dois motivos: para limitar a distância do palco ao ponto mais afastado do auditório, e para que os detentores de camarotes se pudessem mostrar uns aos outros.
Ou seja, a carta não é infundada de todo.

(Fotografia do “Arquivo Fotográfico de Lisboa”)

3 comentários:

teresamaremar disse...

Já o meu avô, grande amante, escolhia o Coliseu, pela seriedade do público.

É um facto que, ainda hoje, e em muitos outros espaços, há quem vá para ver e ser visto. Porém, não descarto que o espaço muito contribui para o encantamento. E quanto ao São Carlos, a magia começa mal se cruza a porta.

Estou a lembrar, há uns 3 anos, num restaurante de Parador, um casal francês, nos seus 80 anos, que dizia "Já quase ninguém se veste para jantar". Subscrevo que há que manter tradições.


A curiosidade com curiosidade... porque comportam os cds de música 74 minutos? ...porque essa é a duração da Nona Sinfonia de Beethoven.

Carlos Faria disse...

Concordo que muitos poderão em momentos convenientes ir à ópera para serem vistos. Recordo-me de que no festival músicatlantico de 2003, foi levado à cena uma versão caseira da Flauta Mágica que se estendeu à Horta. Logo os patrocinadores distribuiram os seus convites pelos seus clientes mais "importantes" enquanto os amantes de música faziam fila à porta do teatro à espera dos escassos bilhetes vendáveis ao público. Coube-me a sorte de ter comprado um bilhete... ao meu lado ficou um amigo convidado... segredou-me logo pensando que tinha tido igual honra "Isto vai ser uma seca, mas se não aparecesse..." ele resistiu até ao final do primeiro acto e foi-se embora, enquanto interessados no espectáculo nem conseguiram entrar! Diga-se que a noite valeu sobretudo pelo pelo Papageno.

Anónimo disse...

o famoso ver e ser visto. mas isso acontece no teatro, em festivais de cinema. o oscar é um exemplo. é um evento cultural, mas que muitos o fazem de forma social. o que é muito importante. beijos, pedrita

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