domingo, 30 de março de 2008

As Óperas de Mozart (6)

No último ano da sua vida (1791), Mozart compôs duas óperas.
“La Clemenza di Tito”, num estilo festivo à velha maneira tradicional italiana, e “A Flauta Mágica”, escrita para um teatro popular dos arrabaldes de Viena.
Esta última é unanimemente considerada a maior obra teatral de Mozart, e o alicerce de toda a ópera alemã subsequente. Embora idealizada para não ser mais do que uma peça cómica com árias e um grande papel para “Papageno”, papel em que poderia inserir uma imensidade de improvisações cómicas e conversas com a assistência no velho estilo arlequinesco, a ópera foi-se desenvolvendo até atingir uma espécie de moralidade do mais profundo significado ético.
Muitos consideram que é a única obra de Mozart em que ele atingiu verdadeira sublimidade.
Discordo.
Por “razões” expressas em posts anteriores.
Das inúmeras gravações de “A Flauta Mágica” em cd, destaco uma que me parece extraordinária: Nicolai Gedda, Gundula Janowitz, Lucia Popp e um fenomenal Walter Berry em “Papageno”, com Otto Klemperer a dirigir a orquestra, uma gravação de 1964, absolutamente imperdível.
Em dvd, James Levine à frente da Metropolitan, numa encenação com Kathleen Battle, Luciana Serra, Francisco Araiza e Manfred Hemm. Não atingindo o nível da gravação proposta em cd, tem ainda assim, muito boa qualidade.
É exactamente o “Papageno” de Manfred Hemm que vamos ver e escutar.
E assim termino este pequeno “olhar” sobre as óperas de Mozart.

sexta-feira, 21 de março de 2008

As Óperas de Mozart (5)

Em “Così Fan Tutte” a comédia é trabalhada e artificiosa, mas como os cantores de ópera raramente são peritos em tal estilo de representação, interpreta-se muitas vezes como farsa violenta, para a qual nem sempre a deliciosa música de Mozart é adequada.
Nunca gozou do mesmo êxito que as outras duas famosas óperas do compositor, e a culpa foi sempre atribuída ao libreto. Os críticos da época decidiram firmemente que a história era “impossível” e também que era repulsiva, porque trata de duas raparigas “parvinhas” a quem um velho e cínico solteirão dá uma benévola lição. Para eles, a mulher era um ideal que nunca devia ser ridicularizado.
Última ópera resultante do trabalho conjunto de Da Ponte e Mozart, “Così Fan Tutte” é mais uma “obra-prima”, e chamo a atenção para a importância de uma boa orquestra na sua execução.
Em dvd, proponho uma produção dirigida por Harnoncourt, com Cecilia Bartoli, Agnes Baltsa e Roberto Sacca, de 2000.
Em cd, Teresa Berganza, Pilar Lorengar e Gabriel Bacquier, dirigidos por Solti em 1974.
Vamos ouvir Gundula Janowitz em “Come Scoglio”.

segunda-feira, 17 de março de 2008

As Óperas de Mozart (4)

O estudo atento de “Don Giovanni” mostra claramente que Da Ponte e Mozart tinham em mente repetir o sucesso de “As Bodas de Fígaro”. Da Ponte voltava a adaptar uma peça antiga, mas desta vez, em vez de possuir uma apurada comédia que pudesse apenas traduzir, dispunha unicamente de um velho libreto italiano a reescrever.
Era uma obra mal proporcionada, e o próprio autor tivera de apresentar as suas desculpas sob a forma de um prólogo, em que glosava um tema favorito dos compositores de ópera do século XVIII : o de uma companhia de teatro em apuros.
“Don Giovanni” é a história dum gentil-homem gozador e do seu cómico criado particular. Esse criado cómico, que aparece em centenas de óperas, é Arlequim – nesta ópera o escudeiro bufão, o porta-voz do poeta quando este reclama o seu direito de criticar o mundo. É uma comédia para divertir, com um toque de sátira social e grande parte de irrealidade fantástica. Nada é real e a moralidade aqui não existe. Mesmo os que consideram que o personagem principal se reveste de um “sex-appeal” irresistível, devem lembrar-se de que todos os seus casos amorosos conduzem-no a situações ridículas e humilhantes.
Seja como for, “Don Giovanni” é uma das óperas de Mozart mais representadas e apreciadas.
Em dvd, sugiro duas produções: uma de 1960, com Mario Petri, Sesto Bruscantini, Leyla Gencer e Teresa Stich-Randall, que é difícil encontrar mas absolutamente fantástica, e outra de 1991 com Thomas Allen, Ferrucio Furlanetto, Carol Vaness e Carolyn James.
Em cd, uma gravação rara, de 1970, com Nicolai Ghiaurov, Bruscantini, Gundula Janowitz, Sena Jurinac e Alfredo Kraus no “Don Ottavio”. É soberba!
Mas evidentemente que há muitas outras, francamente boas.
Vamos ouvir a célebre ária “Là Ci darem la Mano”, cantada por Renée Fleming (Zerlina) e Dmitri Hvorostovsky (Don Giovanni).


terça-feira, 11 de março de 2008

As Óperas de Mozart (3)

Converter a comédia de Beaumarchais “Le Mariage de Figaro” numa ópera cómica italiana era empreendimento ousado. A peça original de que era continuação, “Le Barbier de Séville”, tinha realmente sido planeada para ópera cómica francesa, segundo a velha traça italiana.
É possível admitir-se que sátiras desta espécie não podem pôr-se em música, mas é certo que Mozart e Da Ponte apreciavam muito esse tipo de sátira.
A peça havia sido proibida em muitas cidades. Toda a gente falava dela e todos a queriam ver.
Mas não foi nada fácil a tarefa de Mozart, pois a peça tinha 5 actos, exagerado em ópera, e para além disso teria de construir complicados finais para terminar os actos com todas as personagens no palco, em fila, clamando no registo mais agudo das suas vozes.
Mas se houve alguém em Viena que teve consciência dessa peça que abordava a forma por que um nobre libertino tratava os seus criados, esse alguém deve ter sido o próprio Mozart, que não passara de empregado doméstico enquanto serviu o arcebispo de Salzburgo.
Para a posteridade, ficou uma “relíquia”, uma das muitas que o compositor nos legou.
Vamos ouvir Bryn Terfel na célebre “Non Piu Andrai”.

sábado, 8 de março de 2008

Elina Garanca

Elina Garanca.
Fixem bem este nome…
Ou muito me engano, ou estamos na presença de um “mezzo” que vai dar muito que falar.
Ouvi-a pela primeira vez num recente dvd, “Opera Gala”, onde cantou ao lado de Netrebko, Ramon Vargas e Ludovic Tézier. E se o soprano e o tenor estiveram ao nível do que já se conhecia, o barítono francês surpreendeu-me, mas Garanca excedeu todas as expectativas que tinha. Já me tinham falado dela, mas nunca a ouvira.
Timbre muito bonito, segurança absoluta, à-vontade no palco, percorrendo reportório essencialmente italiano e francês, Elena Garanca cantou “Mon Coeur S’Ouvre à ta Voix” , de “Sansão e Dalila”,como há muito não ouvia.
Para além de recomendar sem hesitações o dvd, sugiro um cd já posto à venda que o mezzo dedicou a Mozart.
E veremos se me dão razão.
Estou seguro que sim.
Vamos ouvir, do já referido dvd, a “tal” ária que me surpreendeu.


segunda-feira, 3 de março de 2008

As Óperas de Mozart (2)

A seguir ao “Rapto do Serralho”, Mozart compôs “As Bodas de Fígaro” (1787), Don Giovanni (1788) e Cosi Fan Tutte (1790), todas elas óperas cómicas italianas sobre textos do mais feliz dos colaboradores de Mozart, o padre Lorenzo da Ponte. Neste campo da ópera italiana nem um nem outro estavam sós ou sem “concorrentes”.
Da Ponte tinha no padre Casti um odiado rival; Casti tinha uma língua das mais venenosas e é uma pena que Mozart nunca se tenha servido dos seus libretos pois são imensamente divertidos. Infelizmente Casti associara-se a Salieri, muito abaixo do génio de Mozart, apesar de ser, ao tempo, bem mais popular.
A exemplo do que mais tarde aconteceria a Haendel e a Wagner, Mozart foi acusado de não saber escrever para vozes e usar orquestrações demasiado ruidosas.
Esta questão é deveras interessante; o que verdadeiramente perturbava os auditores contemporâneos de Mozart era o facto de ele se preocupar muito mais com a orquestra do que os seus pares. Uma partitura pobre e vazia pode frequentemente soar muito mais desagradavelmente barulhenta do que outra cheia de pormenores engenhosos e expressivos.
Mas voltemos às óperas.
“As Bodas de Fígaro” são quase um manifesto revolucionário, “Don Giovanni” já foi considerado “um estudo de patologia sexual” e “Cosi Fan Tutte” foi julgada tão chocante que tiveram de aplicar à música uma série de novos libretos.
Ou seja, Mozart ao seu melhor nível.
Regressarei a cada uma delas nos próximos posts.
Deixo aqui a célebre Abertura das “Bodas” pela orquestra do MET dirigida por James Levine e depois recordemos a grande Eleanor Steber em “Donve Sono”, numa produção de 1951.
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